ARTIGOS

Paulo Ferreira

14/6/2019 11:50

A força mais poderosa de todas

Com a nossa profunda capacidade de adaptação nem nos damos conta de como as nossas rotinas e comportamentos vão evoluindo. Mas basta um banal exercício de memória para confirmar como, em duas décadas, tanta coisa mudou.


Já é um lugar comum dizer-se que a tecnologia está a mudar as nossas vidas.
Com a nossa profunda capacidade de adaptação nem nos damos conta de como as nossas rotinas e comportamentos vão evoluindo. Mas basta um banal exercício de memória para confirmar como, em duas décadas, tanta coisa mudou. Hoje, quando escolhemos e reservamos um hotel ou uma viagem de avião, quando procuramos a mais banal informação ou notícias do que se passa no mundo, quando nos relacionamos e comunicamos com familiares ou amigos ou quando ouvimos música ou vemos uma série ou um filme estamos a fazê-lo de forma diferente do que acontecia há alguns anos.
A inovação tecnológica que permite estas mudanças já mudou de forma profunda muitos negócios e transferiu centros de poder.
Em apenas 10 anos, as maiores empresas do mundo deixaram de ser companhias petrolíferas e industriais e passaram a ser empresas de base tecnológica.

Uma revolução desta magnitude em tão curto espaço de tempo só aconteceu porque os cidadãos a ela aderiram de forma massiva. Porque as novas ferramentas tecnológicas lhe dão enorme conveniência, conforto e utilidade. Mas também porque lhes deram um poder que não tinham. Mais do que nunca, o consumidor tem hoje possibilidades de escolha, comparação, decisão e avaliação pública de produtos e serviços que usa naturalmente em seu favor.

Já conhecemos as mudanças de modelo de negócio provocadas nos media, na mobilidade urbana, na indústria musical e de entretenimento, nas comunicações e na forma como nos relacionamos, para citar apenas algumas.

Mas há outro sector, dos mais poderosos e estruturantes em qualquer economia, que começa agora a sentir o impacto da mudança tecnológica: a indústria financeira, sobretudo a banca de retalho.

Já citei estes dados de um estudo americano noutras ocasiões mas recordo-os porque são impressivos: 70% dos millennials americanos preferem ir ao dentista a ir a um banco; 33% acreditam que não precisam de um banco para nada; e metade diz que os bancos oferecem todos a mesma coisa.
Os dados são inequívocos. Muito já está a mudar no sector financeiro e na relação que tem com os clientes, mas adivinha-se que estamos ainda no início da revolução. Todos os dias chegam novos actores que competem por fatias importantes de mercado – das transferências electrónicas aos cartões de pagamento - e, sobretudo, contribuem para reforçar o poder de opção dos consumidores, que preferem sempre o mais cómodo e conveniente, ainda por cima se for também mais barato e mais rápido.

Este caminho é irreversível. O Open Banking está aí, devidamente selado e regulamentado pela PSD2, a chamada segunda Diretiva dos Serviços de Pagamento da União Europeia.
A interacção de plataformas tecnológicas, devidamente autorizadas pelos clientes, com os seus dados bancários vai contribuir para trazer mais transparência, concorrência e mobilidade dos clientes entre bancos e produtos bancários.
A possibilidade de comparação directa entre produtos bancários e financeiros, tantas vezes complexos, começa a ser efectiva. A negociação com os bancos vai ser cada vez mais exigente. A competição entre estes também, tanto a nível nacional como no mercado bancário europeu.

A quantidade de informação à disposição dos clientes para a tomada de decisões está a aumentar e as ferramentas tecnológicas ajudam a dar-lhe utilidade prática e rápida.
Por outro lado, isso traz novas exigências a clientes individuais ou empresariais, que têm de ter níveis de conhecimento e literacia financeira que lhes permitam nivelar o equilíbrio na interacção e negociação com os bancos.

São desafios novos colocados a todos com a certeza de que isto não vai parar. Não há leis ou barreiras à entrada que travem a digitalização da banca e da nossa relação com o dinheiro. Por uma razão muito simples: a principal força de mudança vem dos consumidores e do que exigem por lhes ser mais conveniente. E essa é a força mais poderosa de todas.

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